Deitada na cama, mirando o relógio
tiquetaqueando sobre a prateleira logo a frente me pego a pensar um
pouco sobre a imensidão de possibilidades que envolvem cada segundo que
move o ponteiro daquele objeto. Mais precisamente, penso sobre timing.
A definição de timing seria mais ou menos como ter o seu momento, cada coisa em seu devido lugar, no seu preciso espaço de tempo. A base do timing
é o livre arbítrio, e como não poderia deixar de ser, cada um tem o seu
e faz dele o que bem entende. E se existe uma coisa na vida que não tem
como moldar é o poder de escolha do outro.Somos feitos de um barro único. Cada pessoa no mundo tem sua carga de
medos, receios e a bagagem mais pesada que existe: expectativas. E o
engraçado disso tudo é que expectativa é uma coisa tão nossa, fruto de
vontades tão individuais que a gente teima em cometer um erro
gravíssimo, que é justamente depositar sobre os ombros alheios desejos
que são muito pessoais. Daí a gente começa a cobrar, exigir, demandar
atitudes que na maioria das vezes o outro simplesmente não está
preparado para corresponder.
Na vida a gente vem por um caminho, o
outro vem por um diferente. Os dois podem ter chegado a uma mesma
trincheira, numa mesma volta do relógio, mas se você veio por um atalho
no bosque e o outro por uma longa estrada no deserto, isso muda
completamente a forma como ambas as partes decidem continuar a
trajetória. Mas entender o tempo do outro e ter paciência suficiente
para esperar aquele momento precioso em que os dois estão pisando com o
mesmo pé, com a mesma força, na areia da mesma praia, é um esforço quase
tão difícil quanto entender que amar alguém não necessariamente implica
em ser amado de volta. A base da compreensão do timing é a mesma do amor: nada na vida é barganha. Não dá pra querer pelo outro.
Então não interessa se vocês namoram há
10 anos, 7 meses, 2 dias e 14 horas. Não interessa se você deixou de ir a
chás de panela para marcar presença em chás de bebê. Não interessa se o
tempo está passando e você sente necessidade de algo mais para preencher o buraco que a
expectativa criou. Se ele/ela ainda não se sente preparado para morar
junto, noivar, casar, ter um filho que seja, nada no mundo será capaz de
fazê-lo mudar de ideia.
A mesma história fica evidente quando a
gente conhece uma pessoa legal que por algum motivo age como um completo
idiota. Acredito firmemente que existe uma grande diferença entre
pessoas sem caráter e pessoas com passado. Infelizmente (ou não) aquela
história de “seu passado te condena” é a mais pura verdade. O que somos
hoje, é fruto e reflexo direto de todas as experiências boas e ruins que
já vivemos na vida. Então não adianta querer um relacionamento sério
com um cara que acabou de terminar um namoro de anos. Ele, assim como
todo mundo, precisa de um tempo para processar certas perdas, recolocar
as roupas velhas no guarda-roupa e abrir as janelas do coração outra
vez. Da mesma forma, não adianta querer convencer uma mocinha que teve
seus sentimentos drasticamente negligenciadospor alguém a se entregar tão prontamente
ao amor novamente. Cada pessoa tem seu próprio tempo de cura, cada um
sabe quando é tempo de dar mais um passo adiante ou quando é hora de
parar e esperar uma brisa mais agradável para proceder com a caminhada. O
seu timing pode não ser o do outro.
Ou a gente aceita, coloca um banquinho
do lado da porta e espera o outro entrar, feliz e satisfeito com isso.
Ou a gente aceita, coloca um banquinho do lado da porta e deixa o outro
sair, igualmente feliz e satisfeito com isso.
Expectativa é bom até o limite em que
ela ultrapassa as gostosas borboletas no estômago para virar
caraminholas na cabeça. Melhor do que ter sonhos com alguém, é saber que
esse alguém tem os mesmos sonhos com você porque ele simplesmente assim
deseja e não por uma mera convenção social.
O relógio sob a prateleira, ruidosamente caminhando pela casa dos segundos, me fez entendeque assim como as pessoas, o ponteiro
tem o tempo certo de correr pelos minutos. Paciência para que os
relógios parados comecem a se mover, para que os ponteiros se afinem,
para que o tiquetaque da vida seja agradavelmente o mesmo. Ou
simplesmente coragem, para abandonar o velho relógio de prateleira e
deixar que o primeiro raiar de sol nos diga quando é hora de acordar.
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